STF mantém regras atuais para demissões sem justa causa

Carlos Moura/SCO/STF
31 de maio de 2023
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STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu nesta sexta (26) o julgamento sobre a validade de um decreto do então presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a possibilidade de demissão sem justa causa.

Embora a análise tenha sido encerrada, com placar de 6 a 5 pela manutenção do decreto de FHC, e assim mantendo regras atuais que possibilitam a demissão sem justa causa, o resultado só será oficializado na próxima semana com a publicação do resultado pela presidente do STF.

O caso, uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), começou a tramitar no STF 1997. A norma trata da legalidade de um decreto cancelando a adesão do Brasil à Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

Essa convenção estabelece critérios para o encerramento de contratos de trabalho por iniciativa do empregador.

O decreto de FHC é de 1996 e foi contestado no STF pela Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura).

A entidade defendeu a invalidação do decreto porque ele teria feito o Brasil sair do tratado internacional sem aval do Congresso Nacional.

No entendimento da Contag, como os parlamentares participam da inclusão na Legislação brasileira de normas previstas em acordos internacionais, eles deveriam também se manifestar em caso de decisão por deixar de cumpri-las.

Mesmo sem o resultado oficializado, os votos dos ministros mostram que a posição defendida é a da necessidade da manifestação do Legislativo, mas nos próximos casos a partir da publicação do resultado da votação.

Ministros como a presidente da corte, Rosa Weber, e os ex-ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Levandowski, consideraram que o decreto de FHC precisaria ter passado pelo Congresso para ter validade e, ao não fazer isso, a publicação é inconstitucional.

Os ministros Kassio Nunes, André Mendonça e Gilmar Mendes seguiram o entendimento de Teori Zavascki, que foi complementado em voto posterior de Dias Toffoli. Para eles, o pedido da Contag não deveria prosperar.

“Nesses termos, tratando-se de prática secular, entendo que os atos de denúncia unilateral por parte do Presidente da República gozavam de aparente legitimidade, motivo pelo qual se mostra necessária a preservação da estabilidade e da segurança jurídica das relações consolidadas até a fixação desse entendimento por esta Corte”, afirmou Mendes em seu voto.

Em seu voto, Kassio Nunes Marques citou que outros países também não seguem a convenção da OIT alvo do decreto de FHC.

“Além de todas as razões expostas por Suas Excelências, é importante destacar que, conquanto louvável o zelo do art. 158, OIT, seus efeitos podem ser adversos e nocivos à sociedade. Isso provavelmente explica a razão da denúncia feita por decreto pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso à época, cioso quanto ao fortalecimento do número de empregos”, afirmou.

ENTENDA O CASO

Os ministros decidiam a validade de um decreto de 1996, do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que suspendeu a aplicação da Convenção 158 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

A convenção sobre término de relação de trabalho por iniciativa do empregador foi aprovada em 1982 e entrou em vigor no plano internacional em 1985. Ela foi ratificada por 36 Estados-membros da OIT, tendo sido ratificada pelo Brasil em 5 de janeiro de 1995 e denunciada em novembro de 1996.

Na última semana, o Supremo retomou a discussão da legalidade da decisão tomada por FHC à época. O que o STF julgou se o ex-presidente poderia retirar o país de uma regra assinada com um organismo internacional sem pedir autorização do Congresso.

O tema também dividia entidades representantes dos trabalhadores e sindicatos patronais —enquanto as primeiras defendiam que a convenção protege os trabalhadores, as representantes patronais alegavam que ela aumenta a burocracia e inibe novas contratações.

A CBIC (Câmara Brasileira da Indústria de Construção) avalia que o mais adequado era validar o decreto presidencial que suspendeu a aplicação da convenção 158.

“No mérito, o perfil da economia brasileira e a dinâmica das contratações, especialmente em um setor sazonal como o da construção, não permitiria a adoção das regras da convenção 158 em sua integralidade”, diz a entidade.

A CBIC também afirma que a aplicação do texto da OIT traria “maior mecanização e, por certo, menor criação de empregos. Dificultar a dispensa pode ser uma forma de desincentivar a criação de empregos. E não é o que queremos”.

Lirian Cavalheiro, consultora jurídica da Febrac (Federação Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços de Limpeza e Conservação), lembra que o primeiro julgamento desse processo ocorreu em 2003, e o Brasil durante esses 26 anos passou por diversas modificações na legislação trabalhista, inclusive com a reforma trabalhista de 2017.

Segundo a OIT, a convenção cria uma camada de proteção social ao “orientar sobre os procedimentos e as garantias mínimas para tornar a demissão sem justa causa um processo que respeite a dignidade do trabalhador e leve em consideração o diálogo social e alternativas à dispensa”.

“Acreditamos que a convenção 158 não se enquadra no Brasil neste momento e nosso posicionamento é pela improcedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedindo que o Congresso se pronuncie sobre a matéria. Isso atende as relações de trabalho hoje no Brasil”, diz.

Ao Portal da CUT (Central Única dos Trabalhadores), o advogado José Eymard Loguercio, que presta assessoria jurídica à central, disse que a convenção protegia o trabalhador de demissões arbitrárias.

“Não pode acordar num dia, olhar para o trabalhador e dizer ‘não fui com tua cara hoje, por isso vou te demitir’. A 158 determina que deve-se justificar o motivo. É a proteção contra a demissão arbitrária que não tenha motivação financeira, administrativa ou econômica, salvo os casos de demissão por justa causa, previstos na CLT [Consolidação das Leis do Trabalho].”

Fonte: Fabio Serapião / Douglas Gavras / Folha de São Paulo

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