Supremo derruba decisão do TST sobre responsabilidade de dívida trabalhista

16 de setembro de 2021
Por: Vânia Rios

Empresa pertenceria ao mesmo grupo econômico do empregador

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que pretendia responsabilizar uma empresa, na fase de execução do processo trabalhista, pelo pagamento de verbas devidas a um trabalhador. Ela foi incluída na cobrança por supostamente pertencer ao mesmo grupo econômico do empregador.

Gilmar Mendes entendeu que uma empresa só deve responder por verbas trabalhistas se estiver listada como parte desde o início do processo, com base no parágrafo 5º do artigo 513 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Na decisão, determinou que o TST volte a analisar o caso porque ainda não se manifestou sobre a constitucionalidade da previsão do CPC.

A decisão reabre a discussão sobre uma jurisprudência consolidada há quase 20 anos. Desde 2003, com o cancelamento da Súmula nº 205 do TST, os juízes trabalhistas têm como prática incluir empresas que participariam do mesmo grupo econômico apenas na fase de execução.

Para advogados de empresas, a prática violaria o direito de defesa de partes que não participaram da discussão desde o início do processo. Já advogados de trabalhadores alegam que a previsão do CPC dificulta a execução, porque nem sempre é possível no início da ação indicar todas as empresas que poderiam ser responsabilizadas.

Na decisão, o ministro observa que “há uma situação complexa e delicada na perspectiva do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa no que toca aos processos trabalhistas desde o cancelamento da Súmula 205 do TST, em 2003”.

A partir do advento do CPC de 2015, acrescenta, “merece revisitação a orientação jurisprudencial do juízo a quo no sentido da viabilidade de promover-se execução em face de executado que não integrou a relação processual na fase de conhecimento, apenas pelo fato de integrar o mesmo grupo econômico para fins laborais” (ARE 1160361).

Segundo o advogado que assessora a empresa no processo, Alexandre Laurea Dutra, a decisão do ministro é muito importante para tentar mudar o posicionamento da Justiça do Trabalho. “A empresa não pode chegar no fim do processo e simplesmente pagar a conta, sem nem saber o que está acontecendo”, diz.

No caso, afirma Dutra, trata-se de uma pequena empresa da área de turismo que está sendo responsabilizada indevidamente pelo passivo bilionário de um grupo econômico que faliu. Para ele, o artigo do CPC é muito claro e não deixa margem para dúvidas de que só deve ser responsabilizado aquele que participou desde o início da ação.

Aref Assreuy Junior, que assessora a empresa em Brasília, afirma que essa decisão deve jogar uma nova luz nesse debate. Ele lembra que o TST analisou que pontos do CPC poderiam ser aplicados na Justiça do Trabalho, mas que esse tema não foi abordado.

“A Justiça do Trabalho simplesmente não aplicou dizendo que não se trata de contratos, mas o CPC pode ser usado como fonte subsidiária onde não há previsão na lei trabalhista”, diz. Agora, acrescenta, o caso deve voltar para a 4ª Turma do TST, responsável pela decisão, e provavelmente ser remetido ao Pleno.

A advogada Juliana Bracks, contudo, pondera que, apesar de ser difícil para as empresas se defenderem somente na fase de execução, até mesmo por conta da necessidade de depósito em juízo, para os trabalhadores “ficará praticamente impossível executar” caso prevaleça o entendimento de Gilmar Mendes. “Incluir todas as empresas que possivelmente fariam parte de um grupo econômico desde o início do processo é muito difícil. Até porque existem empresas que criam outras depois para fugir das execuções”, diz.

Para Ricardo Calcini, professor da pós-graduação de Direito do Trabalho da FMU, a Justiça do Trabalho, ao cancelar a súmula, estava pensando em racionalizar o processo, deixá-lo menos burocrático. “Até porque muitas execuções não estavam sendo satisfeitas”, diz.

A decisão de Gilmar Mendes, afirma, é um precedente importante porque os tribunais trabalhistas não estão aplicando o CPC, sem que declarem que a previsão é inconstitucional. “Se esse entendimento de que as empresas devem participar desde o conhecimento da ação emplacar, muitos grupos econômicos deixarão de ser reconhecidos”, diz.

Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, entende que a decisão de Gilmar Mendes caminha no mesmo sentido da reforma trabalhista, de que o grupo econômico precisa estar bem caracterizado para responder pela dívida.

Procurado pelo Valor, o advogado do trabalhador no caso preferiu não se manifestar.
Fonte: Valor Econômico

Leia mais
© Febrac 2024 - Todos os direitos reservados
Políticas de privacidade